terça-feira, 23 de março de 2010

As estórias que nos contamos





    Todos somos, em diversos níveis, grandes contadores de estórias. Muitas vezes contamos coisas que alegram, fazem rir e suspirar. Outras tantas, entristecem, afligem ou irritam.
    Assim como são variadas as estórias, variado também é o público que ouve essas estórias. Há porém, alguém que sempre ouve a todas, até as que não chegamos a contar. Estes ouvintes fiéis somos nós mesmos!
    São estórias não só sobre nossa versão do que já ocorreu, mas as estórias sobre as impressões que temos do que acontece ao nosso redor. 


    - Ah, aquele cara está fazendo isso só pra me irritar!
    - Ela tá vendo que vai derrubar e faz assim mesmo!
    - Ele está tentando me prejudicar, mas vai ver só!
    - Ela sabe que esse assunto me entristece mas sempre fala nisso!
    - Ele me conhece, por que ainda fala assim comigo?


    Quantas estórias que tornam os acontecimentos ao nosso redor uma experiência ruim, pesarosa, desgastante! Quantos frutos de uma imaginação que parece distorcer a realidade!
    Me lembro de uma vez que estava no trânsito e um carro ao meu lado mudou de faixa abruptamente e me fechou. Eu freei seco e logo deduzi: "Esse filho da p* está querendo me matar! Ele vai ver só!!!". Buzinei, esbravejei, xinguei, agitei o braço de dentro do carro e ultrapassei o carro. Quando cheguei no próximo semáforo, vi pelo retrovisor que ele se aproximava e vinha baixando o vidro do passageiro. Já imaginei: "Agora ele vai começar a xingar e reclamar das buzinadas. Vou aproveitar pra xingá-lo mais ainda!". Abaixei o vidro do meu carro e esperei que ele falasse primeiro. O homem me olhou, levantou o braço direito, com a mão aberta e disse: "Ô amigo, me desculpa viu ali atrás. Eu não vi você! Me desculpe mesmo!"
    A reação do homem ao meu comportamento me desarmou por completo. Eu que usava uma carranca típica de um guerreiro selvagem pronto pra batalha mais feroz, me vi totalmente sem graça com minha atitude. Foi minha vez então de erguer o braço e pedir desculpas pela minha reação exagerada e pela minha falta de paciência.
    Para vivermos em paz, é necessário contar histórias de paz, para então vivê-las. Se estamos sempre carregados de mágoas, armados com respostas, reações prontas, é porque estamos procurando situações para usá-las. E é impossível ter tranquilidade com esse tipo de bagagem, pois sempre acabamos usando nas situações erradas, com as pessoas que mais gostamos ou então nos arrependendo por ter feito uso com quem quer que seja.
    Que nossa bagagem seja leve. Seja mansa e pacífica. Que se formos escolher os exemplos de como tratar nosso próximo, que sejam os exemplos daqueles que viveram a felicidade que a paz e a serenidade traz: o Cristo, o Bhuda, Ghandi, Madre Tereza, Chico Xavier, pra citar só alguns. E que nossas estórias ao pouco percam a distorção e a opacidade e se tornem concisas e vívidas de transparências.

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